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ENTRE GRAÇA E RAÇA – ALGUMAS REFLEXÕES

“Olhei de novo e vi uma multidão imensa, grande demais para ser contada. Gente do mundo todo estava ali – todas as nações e tribos, todas as raças e línguas. E eles estavam de pé, vestidos de roupa branca. Carregavam folhas de palmeiras e diante do trono e do Cordeiro...” (g.n) Ap 7.9 – Bíblia A Mensagem.

No dia 20 do mês de novembro, se comemora em todo o Brasil o Dia da Consciência Negra. Em apertada síntese, os idealizadores intentaram trazer para o debate, principalmente, a defesa da cultura, religião e outros aspectos da matriz africana os quais contribuíram e influenciaram, de forma geral, a formação do Estado Brasileiro. A data foi instituída no ano de 2003 (inclusão no calendário escolar), tomando por marco o mesmo dia em que teria morrido Zumbi dos Palmares. Zumbi, sucessor do tio Ganga Zumba, é considerado o grande líder do Quilombo dos Palmares¹. 

O Dia da Consciência Negra se torna, por assim dizer, uma espécie de grito, não de todas as pessoas, mas especificamente aquelas de pele negra e parda, que de alguma forma estejam, se vejam ou se sintam escamoteadas socialmente. Talvez a consideração aqui soe reducionista, mas nos servirá de ponto de partida para a abordagem principal pretendida, qual seja alguma reflexão sobre a graça salvadora de Deus e as questões aflitivas e conflitivas sociais. Essa graça divina tem raça?

É indiscutível que as diferenças existentes na sociedade deixam pessoas alijadas de necessidades básicas como saúde, educação e segurança. Nesse sentido, um amplo debate é aberto sobre as vítimas sociais. Com o negro, isso não é diferente. Mas, até onde a questão vai, deixando de ser um ponto importante para se combater desigualdades à luz das Sagradas Escrituras (considere que a Bíblia é a regra de fé e de prática do cristão, principalmente o evangélico) e se transforma em vitimização? O que é pior: um argumento para aceitação ampla e incontestável sobre todos os aspectos porque muito já se sofreu e há uma “dívida histórica” que deve ser paga? 

O assunto, no campo teológico, na maioria das investidas não encontra outros parâmetros que não estejam, de alguma forma, imbricados aos ideológicos. Nesse sentido, fica difícil alguma espécie de isenção considerada, porquanto quem analisa toma as suas conclusões por certas, obviamente à luz de sua (as) cosmovisão (ões). Buscou-se aqui uma abordagem mais teológica, a partir de alguns escritos observados. Não é a inclusão nas diversas pautas sociais, em detrimento da condição de “ser negro”, que à luz do Evangelho as pessoas devem ser (e se sentir) incluídas. O Evangelho por si só já é inclusivo, por uma questão que não se olvida: a graça de Deus. 

A cruz de Cristo precisa ser o ponto central dessa observação. Lá, quem foi atraído? Uma raça específica? Pobres? Ricos? Héteros ou homoafetivos? Adúlteros e dependentes químicos? Crianças pobres e abandonadas em conflitos armados internos de suas nações ou aquelas mais lindas de olhos claros? Mulheres traídas por seus maridos ou velhinhos abandonados em asilos insalubres? As Escrituras trazem que “todos os que andavam sem luz e em trevas”, brilhou a salvação (leia Isaías 9.2). Assim é certo que o Evangelho é inclusivo. Mas, alguns diriam que mesmo onde o Evangelho está existem (ainda que não na mesma proporção) as desigualdades, as fobias, os preconceitos. Isso também é verdade. Contudo, penso que seria mais correto afirmar que tal situação reflete muito mais a falta da prática do verdadeiro Evangelho do que a sua coexistência com as desigualdades. O amor ao próximo é mandamento de Cristo a quem dizemos por Ele ter sido salvos e servir. Se não é a prática, está-se em falta. Mais um pecado. 

O negro não deixará de ser discriminado (mesmo em ambiente eclesiástico – o que soa estranho) porque rendeu-se a Cristo. Sua aceitação não é (e não será) plena neste mundo. Ao receber a Cristo, todos alcançam, pela graça, a salvação eterna. Aí há verdadeira inclusão. Então, enquanto vive e caminha nesta vida, deverá ser vítima do preconceito racial? Uma breve consideração.

Primeiro, porque Deus não chamou para si uma classe específica, estratificada socialmente². Deus chamou, em Cristo Jesus, um povo que, remido e lavado no sangue do Cordeiro, seja Seu. Segundo, porque não há, fora de Adão, uma raça que não seja a humana. É o que aborda Voddie Bauchams, pastor americano negro, autor e educador que considera que raça não é um termo (conceito) bíblico correto, exceto aquele que esteja dentro de determinado conceito histórico, porquanto esse é um termo socialmente criado. À luz das Sagradas Escrituras encontra-se amparo para a afirmativa (leia Gênesis 1.27). Deus criou seres humanos, à sua imagem e semelhança, homem e mulher os criou. 

Mas o negro não seria mais uma vítima? Ele não figura entre aqueles que sofrem muito mais por mortes violentas, desemprego, educação precária, moram e vivem em ambientes hostis, ocupam subempregos? O fato de serem alvos das ONG’s e de programas sociais diversos não confirmam a assertiva da sua vitimização? É.... neste sentido, é sim. Mas deixo aqui uma pergunta (que não é minha) que merece reflexão. E quanto ao branco pobre que não tem ONG nem programa social a seu favor? Como ele fica nessa de vítima? A ideia não é criar aqui celeumas, senão trazer uma compreensão equilibrada do tema. E mais do que isso (porque não se consegue esgotar as considerações todas de uma vez), considerações à luz da Palavra de Deus com implicações para a vivência prática do Evangelho na igreja de Cristo. 

Caro irmão. Se de alguma forma chamei a sua atenção para o assunto aqui exposto, alcancei o objetivo. Nesse sentido, deixo algumas considerações e sugestões finais a fim de que se possa aumentar a compreensão. O pastor Guilherme de Carvalho tem um texto muito interessante intitulado “Os evangélicos progressistas e o caso da ‘cruz de espinal’. Ou: o Novo Bezerro de Ouro”. Segue abaixo o link para quem queira dar uma espiadela depois. A abordagem que ele faz quanto a “vitimização” de condições sociais é importante para as nossas considerações pessoais como cristãos e conhecedores da Palavra de Deus. Guilherme afirma que, “(...) ser vítima não é, em si, mérito. Poderia ser o homem justificado pela vitimização? Não; jamais!”. Ele segue considerando Cristo como a vítima da cruz e considera que a menos que a vítima seja justa, pura e reta, essas seriam as condições para que ela se justificasse. E mais uma vez afirma: “é a justiça da vítima que a justifica, não a vitimização...”. 

Pergunta-se: à luz do Evangelho verdadeiro, qual vítima social - entre negros, brancos, mulheres, crianças, velhos, pastores, papas e cantores - é encontrada justa? Sem pecados? Não há quem. “Ao longo das Escrituras, toda a humanidade é tratada como uma unidade, compartilhando não apenas uma natureza comum, mas uma pecaminosidade comum, não apenas uma necessidade comum, mas uma redenção comum”. Assim, o “Todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Rm 3.23) se torna uma evidência clara de que todos precisam da graça de Deus. E essa não inclui raça (nem cor, nem dinheiro). Inclui gente que é igualzinha. Pecadora.

A graça é graça de graça. É prêmio imerecido. É direto de Deus para o homem humano. Ultrapassa (em muito) os sentimentos do homem, sua cosmovisão, seus limitados pensamentos e enganoso coração. Em todas as situações são oportunidades para se “trazer à lembrança que precisamos do Messias, porque sem Ele todos são malditos”. A graça sobrepõe a justiça, porque, por aquela, multidões de pecados são perdoados (leia 1º Jo 1.7). Não há maior nem melhor inclusão. Ser negro, ultrajado ou não, jamais torna alguém merecedor da graça de Deus. Ah! E a raça? Se de fato ultrapassa o conceito de humano, não tem e nunca terá a cor da graça.

- Lic. Edson Gonçalves - Licenciado

 

¹ Quilombo era uma espécie de povoação fortificada, instalada em matas/florestas, que abrigavam escravos negros, na sua maioria fugidos das fazendas e/ou destas resgatados. O Quilombo dos Palmares é considerado o maior dos quilombos que existiu na América Latina. Localizava-se na região da Serra da Barriga, entre os estados de Alagoas e Pernambuco. Esse quilombo chegou a reunir cerca de 20 a 30 mil habitantes.

² Estratificação social é o instrumento (termo) empregado pela sociologia para a compreensão do funcionamento hierárquico de uma sociedade. Aborda as desigualdades que atingem grupos ou determinados grupos de pessoas.

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