...o que usou de misericórdia para com ele. Então, lhe disse (Jesus): vai e procede tu de igual modo. (Lucas 10.37)
Recentemente li a mensagem de um folheto evangelístico cujo título é bem sugestivo e intrigante. Folheto antigo. O título: errou o céu por 45 centímetros. Nessa mensagem (do folheto), basicamente o autor destaca que entre o coração e o cérebro a distância está em torno de 45 centímetros. E, no conteúdo evangelístico, a ideia de que Cristo não pode estar apenas no cognitivo. Não se pode conhecê-Lo apenas de ouvir, sem tê-Lo no coração.
No texto narrado em Lucas 10, versículos 25 a 37, Jesus é interpelado por um homem que conhece bem a lei de Moisés. Por ser um intérprete da lei, seus conhecimentos são profundos. Então, ele se põe de pé no ambiente onde estavam e pergunta a Jesus como ter a vida eterna. ...que farei (g.n) para herdar a vida eterna? (Lucas 10.25). Uma pergunta de si para si mesmo. Ele tem na mente a Lei de Deus (vide Levíticos 18.5), mas está longe de acertar o Céu. Ele diz a Jesus como entende o mandamento (amar a Deus de todo coração, de toda a alma, de toda força e todo entendimento. Também ao próximo como a si mesmo (Lucas 10.26 e 27)), mas, como todo homem, não pode fazer isso sozinho. Sempre se erra o alvo de amar a Deus de todo coração, força, alma e entendimento. É preciso o socorro dos Céus para este mister.
Ao questionar a Cristo sobre quem seria seu próximo, o intérprete da lei busca justificar-se. Não é suficiente ter os mandamentos todos dentro da cabeça? Não estou apto à Eternidade por conhecê-los na teoria? Jesus o responde e apresenta a oportunidade da prática. Não é sem razão que, em outra passagem, o Filho de Deus nos diz que quem ouve as Suas palavras e as pratica é semelhante ao homem prudente, que edifica sua casa na rocha (Mateus 7, versículos 24 a 27). Não basta conhecer a Verdade por ouvir. Somos chamados a uma vida prática.
É interessante a forma didática como Cristo ensina ao homem da lei quem é o seu próximo. Ele usa a imagem de duas personagens importantes na prática religiosa judaica: o sacerdote e o levita. Ambos estão a serviço do culto. Ambos servem cerimonialmente a Deus. Mas a prática do culto se torna vazia, um ato em si mesmo, quando o que acontece ao meu próximo não reflete em mim a sua dor ou alegria. É preciso celebrar com os que celebram e chorar com os que choram.
Homens religiosos que passam de largo, à distância. Veem, mas não enxergam. Escutam, mas não ouvem. E, se acaso ouvem, não dão a devida atenção. A religião com o fim em si mesma. O exemplo do samaritano mexe com o intérprete da lei, porque há um ranço cultural, social e religioso entre judeus e samaritanos. Vivendo dentro da mesma nação, tendo recebido tudo das mãos do mesmo Deus, conseguem se distinguir por aquelas questões. O Evangelho de Cristo vem confrontar isso também. Conhecer a Lei de Deus não pode ser prática maior que o amor ao próximo, até porque não há como dissociá-la. O doutor intérprete se enganou.
Terminada a parábola (versículos 31 a 36), Jesus dá a oportunidade para que o Seu interlocutor responda o que aprendeu. É a chance de mudar a sua compreensão acerca das verdades sobre Deus, as quais julga conhecer, levando-as para a prática, que é o que se requer. A misericórdia (versículo 37) está acima da prática religiosa, do rito e da agenda costumeira. Servir a Deus é também servir ao meu irmão (Cristo resume toda a lei nisso amor a Deus e ao próximo (Mateus 22.37 a 40)).
Por fim, é importante lembrarmos que nada está acima da Graça. Nada a sobrepõe. Nem o social, nem o religioso. Ambos funcionam por causa dela (da Graça). Se somos em alguma medida misericordiosos, é porque o Evangelho transformou corações e mentes endurecidos. Se servimos a Deus em adoração, cultuando-O em verdade e bom espírito, é porque fomos transformados por Sua palavra e por Seu amor. Nada vem de nós. Tudo é dEle. Não erre o céu!
- Edson Gonçalves - Pastor Auxiliar